Domingo tá bom é prà praia, pá!

A ignorância é uma merda. Os ignorantes que o sejam por vontade própria, que se pavoneiem como não o sendo ou, pior ainda, os que o sendo ainda lhes vêm concedido o direito de voz pública nalgum meio de comunicação: são desprezíveis.
Veja-se um caso eventualmente sintomático: Manuel Falcão, jornalista do Meia Hora. Em artigo de opinião na segunda página, intitulado "Dia 15 vou abster-me", este senhor aparentemente cinquentenário exprime a sua indignação com a campanha eleitoral das intercalares de Lisboa e candidatos envolvidos - e, se bem que sem grande eloquência e fundamentação lógica, com razão (digo eu). Bom, reza assim o último parágrafo do dito artigo:
«Neste panorama, com mais de uma dezena de candidatos, nenhum com ideias interessantes, nenhum com claras capacidades de liderança, que me resta fazer? - A resposta, para mim, é evidente: abstenção, a única maneira de mostrar o meu protesto pessoal pela cada vez maior degradação do regime e pela maneira como os partidos políticos actuam».
Perante isto, a crítica, para mim, é evidente: ignorância, a única maneira de explicar o seu conceito de protesto pessoal pela cada vez maior degradação do regime e pela maneira como os partidos políticos actuam.
Senão, vejamos: o que é abstenção? Entre outras coisas sinónimas, é renúncia. O que é abster-se? Entre outras coisas sinónimas, é não intervir. Protestar implica, está claro, um oposto dessas noções. Além disso, em termos práticos, a abstenção do eleitorado não é um sinal de protesto; é, tão somente, um não cumprimento de um direito e um dever democráticos que, assim o quero crer, tanto custaram a garantir às gerações anteriores (e, suponho, mais directamente envolvido nessa luta esteve este senhor, que, aquando do 25 de Abril, teria idade para ser actor dessa mudança).
É da mais elementar lógica que o voto de protesto é o voto em branco: porque é uma acção física e consciente; porque está prevista na nossa legislação; porque é a prova de que o cidadão cumpriu com a sua participação enquanto votante, deixando, porém, o boletim em branco, como quem diz "não me revejo em nenhuma destas candidaturas" ou, sem papas na língua, "são todos uns merdas, não votarei no menos mau só por votar". É, enfim, um acto de lucidez.
Considero, por um lado, revoltante, por outro, desmotivante, ver que o voto em branco não é devidamente valorizado pelos votantes que, legitimamente insatisfeitos com os nossos mandantes, querem, mais parece, engendrar um alibi moral para reservarem o fim-de-semana para outras andanças. Nunca mais me saiu da cabeça uma frase que vi pintada nalguma parede em Lisboa que dizia assim: «Se ninguém te defende, Vota em ninguém».

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