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A pandemia e a guerra nos canais de notícias 24-7. O trágico recuo da Empatia

Depois de dois anos inteiros de pandemia, três semanas inteiras de guerra. Esta interrompeu aquela, tomou-lhe o lugar de protagonista dos nossos quotidianos. A troca foi súbita e como que total: onde uma dominava, domina agora a outra; o espaço que uma, sozinha, preenchia, a outra o preenche agora, quase em exclusividade. Parece clara a correlação entre o silenciamento mediático da crise pandémica e o actual estardalhaço da guerra. Talvez não tivesse havido ainda uma suspensão tão duradoura e sobretudo tão efectiva da agenda pandémica enquanto facto diário como esta que a cobertura do conflito russo-ucraniano trouxe. Trata-se, nem seria preciso dizê-lo, de dois fenómenos perfeitamente distintos na sua substância. E, no entanto, no que toca ao discurso e à sua feição mediática, ficam na retina alguns paralelismos importantes.   O «agora» como valor absoluto Aquilo a que se chama a «informação televisiva» conheceu, com o advento e proliferação recentes dos canais especializad...

Fóruns de opinião pública

Os fóruns de opinião de ouvintes e telespectadores são, apesar de tudo, um dos melhores meios de expressão pública existentes. Nestes fóruns, o cidadão anónimo tem valioso tempo de antena para emitir a sua opinião pessoal, frequentemente desprezada e manietada. Da posição de mero espectador de um imenso espectáculo radio-televisivo que, apesar de fugir de todo ao seu alcance e, tantas vezes, vontade, determina em muitos aspectos o seu dia-a-dia em casa, no trabalho e no descanso, o Zé Ninguém vê-se assim com a chance de dizer de sua justiça a muitos outros zés e, a tanto possa a esperança, uns poucos de politicões. Como em tanta outra coisa, o seu uso deve ser regulado pelo bom-senso e pertinência, não vá dar-se azo a que se restrinjam as condições de participação e transmissão, ou, até, se encerrem estes espaços. O perigo de semelhante mudança acontecer parece-me real, especialmente no caso dos fóruns da rádio e da televisão públicas, que, ainda que pareça certo que se regem pelos me...

A sublime tristeza da revolta impotente

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Há algo de trágico e cómico no momento. O jornalista que arremessou o sapato a Bush será certamente prejudicado por aquele acto. E nada mudará. É sublime a tristeza da revolta. É pungente a tristeza da impotência. . [ver vídeo]

Lembrete

Quando falei em descaramento ministerial , nem sequer me ocorreu que a cena punha a nu outra situação: a dos acordos de bastidores entre governantes e jornalistas - o que será, tudo indica, um upgrade democrático das «conferências de imprensa sem direito a perguntas» que aqui há tempos estavam na berra. E o facto de ter sido um repórter da RTP a quebrar o compromisso permite uma outra constatação: a de que os seus colegas das televisões privadas, mais obedientes, o cumpriram.

O descaramento da ministra...

"O quê? O senhor não sabe o que está combinado? Que hoje só se pode fazer perguntas sobre esta cerimónia e sobre o plano de combate à sida nas escolas? Ainda por cima é a RTP, a televisão pública, a fazer uma coisa destas. E, depois, logo à noite, não sai a reportagem." . Ana Jorge, Ministra da Saúde, dirigindo-se a um jornalista da RTP que, durante a apresentação do plano governamental de combate à SIDA nas escolas, questionou a Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, acerca da contestação da classe docente.

Os alvos que interessam

Será que o alvo dos atentados em Bombaim foi realmente "a presença ocidental" na cidade? O fundamento de tal assunção é tão válido quanto o desta: os responsáveis por estes ataques visaram os locais que mais provavelmente lhes dariam visibilidade a nível global (e não só local). A visibilidade é concerteza fulcral num crime desta índole. E este cálculo de visibilidade tinha logo à partida uma margem de erro muito reduzida, tendo em conta os critérios da cobertura a acontecimentos passados, como ao tsunami ao largo da Indonésia ou, num sentido quase diametralmente oposto, o terramoto no coração do Paquistão (que, por sua vez, interessa comparar ao atentado no Marriott , na capital do mesmo país). A frequência de ocidentais nos locais atingidos era portanto uma variante da equação que não podia ser descurada. E isto desmente, em certa medida, a visão veiculada pela comunicação social do lado de cá (geografias à parte), a qual comecei por citar (nota ainda para a seguinte ...

Corsários negros

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Do mesmo modo que vejo o terrorismo sobretudo como uma prática decorrente de uma injustiça primordial e um meio efectivo e desesperado de luta ao alcance das vítimas dessa injustiça, penso que a pirataria é sobretudo uma resposta igualmente extrema à subjugação que, no caso da Somália, sempre foi imposta àquelas gentes em especial desde os finais do século XIX. Uma reportagem do Público de sexta-feira passada em Haradhere dava conta de que, para os somalis daquela pequena cidade costeira para onde foi levado o gigante Sirius Star (símbolo supremo dum dos maiores cancros da sociedade industrializada), os piratas representavam fonte de comércio, emprego e, mais importante, comida. O bloqueio naval proposto ontem pelo director-chefe da toda-poderosa Intertanko , e felizmente posto de parte pela NATO, prejudicaria, em primeiro lugar e à imagem de outros embargos exóticos, a população local. A este propósito seria pertinente questionar sobre em que contexto floresceu a pirataria. Nesta ...

Revista de Imprensa (short version)

A notícia começa assim ( link ): "Um especialista em "gripe das aves" disse" . Uh, promete. E continua: "Senão [sic] nos preparamos para uma pandemia, podemos ter cenários onde milhões de pessoas vão morrer" . Uh, medo. E mais: ""Se não formos comunicativos, a pandemia pode estalar num qualquer lugar do mundo e chegar ao outro lado do planeta em horas", alerta" . Estalar, uh. A mediática pandemia ainda (!) está na ordem do dia, apesar de não ser pandemia coisa nenhuma - só matou 243 pessoas em cerca de dez anos, mas já foram muitos ( muitos mesmo) os milhões investidos em "fundos de prevenção", "stocks de fármacos" e "conferências de especialistas". Já foi há mais de dois anos que tive oportunidade de me pronunciar sobre a coisa ( link ) e a ideia mantém-se. Ao que tudo indica, a mortífera «gripe das aves» anda a par com o obscuro «terrorismo internacional», com o ameaçador «aquecimento global» e com (ist...

Domingo tá bom é prà praia, pá!

A ignorância é uma merda . Os ignorantes que o sejam por vontade própria, que se pavoneiem como não o sendo ou, pior ainda, os que o sendo ainda lhes vêm concedido o direito de voz pública nalgum meio de comunicação: são desprezíveis. Veja-se um caso eventualmente sintomático: Manuel Falcão, jornalista do Meia Hora. Em artigo de opinião na segunda página, intitulado "Dia 15 vou abster-me", este senhor aparentemente cinquentenário exprime a sua indignação com a campanha eleitoral das intercalares de Lisboa e candidatos envolvidos - e, se bem que sem grande eloquência e fundamentação lógica, com razão (digo eu). Bom, reza assim o último parágrafo do dito artigo: « Neste panorama, com mais de uma dezena de candidatos, nenhum com ideias interessantes, nenhum com claras capacidades de liderança, que me resta fazer? - A resposta, para mim, é evidente: abstenção, a única maneira de mostrar o meu protesto pessoal pela cada vez maior degradação do regime e pela maneira como os partido...

You

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“Porque tu és «o povo», «a opinião pública» e «a consciência social». Já alguma vez pensaste na responsabilidade gigantesca que estes atributos te conferem, Zé Ninguém? Já alguma vez perguntaste a ti próprio se pensas correctamente, quer do ponto de vista da trajectória social onde estás inserido, quer da natureza, quer até de acordo com os actos humanos de uma figura como, por exemplo, a de Cristo?” (Wilhelm Reich, Escuta, Zé Ninguém! ) A Time nomeou-nos «Pessoa do Ano de 2006» anteontem [18/12/2006] (a utilidade de existir uma atribuição deste género é muito discutível, especialmente se não considerarmos o(s) eleito(s) deste ano). Rotulados de Web 2.0 , vamos tendo motivos de orgulho e de preocupação, já que se é verdade que vamos sendo responsáveis pela manancial criação de cultura visual e escrita (sobretudo no youtube e na blogosfera), parece-me também que o produto dessa realidade é, muitas vezes, de qualidade duvidosa – além de que, pela (tantas vezes elogiada) velocidade a qu...