O mero prazer, a irritação mais ou menos profunda, o aborrecimento: estes sentimentos, e enfim todos os que possamos apontar, são apenas periféricos, parciais, superficiais; e uma mulher a que nos liguemos não nos inspirará jamais esses sentimentos. Podemos crer que sim, se, mais tarde, reflectirmos acerca dalguma experiência ou ocasião partilhadas com essa mulher ou dalguma maneira a ela associada e tentarmos esquematizar ou traduzir aquilo que sentimos. Mas isso será sempre uma redução ao inteligível, ao dizível, uma fragmentação aleatória do todo que não somos capazes de nomear por inteiro. Isto é, fazer sexo com a mulher amada não é uma experiência «de prazer» - ainda que necessariamente o prazer nos beneficie - bem como um desentendimento com ela não é apenas uma contrariedade; antes são dois acontecimentos totais em que nada mais se ouve, nada mais existe. As suas consequências ultrapassarão sempre, e largamente, a nossa percepção e a nossa capacidade de ajuizamento, mas serão sentidas em toda a sua extensão e deixarão a sua marca. Se se passar de forma diversa, não é Amor. E isto é tanto mais verdadeiro quanto tentar dizê-lo de forma mais específica ou mais completa resultará invariavelmente em dizê-lo mal.

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