Mitos da covid-19

Desde o início do ano que tenho visitado, com inusitada frequência, os sites da DGS e da OMS. Sinais dos tempos, suponho. Seja como for, estas visitas resultam sempre, claro, em leituras de alevantado interesse cultural e recreativo. Nem outra coisa seria de esperar.

Mas isto é outro nível:


Esta sub-página do site da OMS (link) foi criada com o objectivo de desmistificar uma série de coisas que, aparentemente, foram sendo veiculadas a propósito deste rebuliço da covid-19. É de presumir, uma vez que a OMS se dá ao trabalho de os desmontar e desmentir, que estes mitos conheceram uma importante fortuna e difusão um pouco por todo o Mundo ao longo dos últimos meses. Lê-los à luz desta assumpção, e tendo como pano de fundo que vivemos no século XXI d. C. e portanto a uma valente distância de higiene dos rebarbativos e tenebrosos idos da Idade Média, dá-lhes um brilho especial.

Há de tudo um pouco. Sem que estejam assim organizados, os Mitos versam quatro grandes temas: propagação & contágio; prevenção & tratamento; detecção & auto-diagnóstico; e máscaras.

Sobre este último, duas coisas se esclarecem: que não se deve usá-las enquanto se faz exercício físico (isto deve incluir a prática do Amor) e que, "se bem usadas", as máscaras cirúrgicas não provocam intoxicação por CO2 ou sub-oxigenação.


Não será certamente abusivo concluir, no avesso desta mensagem, que o uso prolongado de outras máscaras que não cirúrgicas (que é o que mais se vê) pode ter esse efeito. Basta pensar que passamos a respirar muito mais o ar que expiramos, rico em CO2. De resto, inúmeras pessoas que estão actualmente obrigadas ao uso permanente de máscara ao longo da jornada laboral queixam-se de desconforto e mal-estar generalizado.
Num outro plano, quem é que usa devidamente uma máscara, cirúrgica ou não? A mais distraída das consultas de qualquer uma das infografias da DGS ou da OMS dará uma resposta cabal a essa interrogação. Ninguém.
Estas questões ganham especial relevância agora que o novo ano lectivo arrancou e as normas determinam, marcialmente, milhões de crianças a usar máscara o dia todo, sem interrupção.

Sobre o tema da detecção & auto-diagnóstico (as categorias são da minha lavra), há dois mythbusters particularmente hilariantes.
Um, que dá a saber que ser capaz de suster a respiração por 10 ou mais segundos sem tossir ou sentir desconforto não significa que a pessoa esteja livre da covid-19.
Outro, que trata de desmentir que os thermal scanners (a expressão portuguesa é muito mais sexy: pistola-termómetro) não têm a capacidade de detectar se alguém tem esta doença.

(som de grilos)

As coisas não melhoram com o tópico da propagação & contágio. Retoma-se a ideia dos sapatos enquanto veículo de transmissão do vírus para dentro de casa (esclarece-se que a possibilidade é muito remota) e explica-se que nem os mosquitos, nem as moscas (as moscas...?) são transmissores.
Mas o melhor é este:


Isto é genial.

Finalmente, o tema prevenção & tratamento. Aqui se esclarece que uma série de coisas não previne ou combate a covid-19. É polémico. Mas quem o diz não sou eu, é a OMS.
O alho, a neve, o vinho tinto, os secadores das mãos, os antibióticos, o Sol, o uísque, os banhos quentes, a hidroxicloroquina, a lixívia, a imperial, a pimenta na sopa, o álcool etílico, a ginjinha, a vacina da pneumonia, os banhos frios.
Nada disto - pasme-se - previne ou combate a covid-19.





O grau de ignorância, superstição e pânico que, por inferência, estes Mitos sugerem é simplesmente chocante. Imensas vezes me tenho questionado sobre como olharemos para estes tempos daqui a uns anos. Vou antecipando que o fenómeno da não-inscrição que José Gil identificou no ser-português não se cinge ao território nacional e que, portanto, pensar que haverá quem se vire para trás e os olhe - a estes tempos - afigura-se-me, antes de mais, como uma (mais uma) ingenuidade minha.
Seja como for, ela aí fica, esta página da OMS, para memória futura - como a grotesca, risível, perturbadora caricatura destes dias.

Gostava de encerrar com este fact:

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