Não ter o juíz da partida, aos 4´ da primeira parte, apitado penalty a favorecer o Sporting foi uma bênção divina para os atletas do emblema do leão: daquele minuto em diante, o céu desanuviou-se-lhes nas mentes, as negras nuvens dos tempos regulamentar e de compensação, das flash interviews e das conferências de imprensa afiguraram-se-lhes leves como penas, livres de julgamento e responsabilidade: “o árbitro não marcou o castigo máximo, temos desculpa”, entoavam-lhes aos ouvidos, num coro celestial, todos os anjinhos das mil crenças humanas. Ainda os rapazes de verde e branco rejubilavam nestas auroras e já um bracarense metera uma na gaveta do jovem luvas. Mas nada que abalasse os assegurados jogadores de Alvalade: a grande penalidade não assinalada era a remissão completa.
O jogo desenrolava-se sem grandes sobressaltos, numa paz de igreja, "é deixá-lo correr", quando um estouvado suplente embica de pé de esquerdo o tento do empate (porventura de cabeça perdida de amores e suores, com as curvas e reentrâncias da parceira no pensamento). Graças aos deuses do Olimpo e do Campo Grande, aquele gesto irreflectido foi a tempo corrigido: o próprio delinquente, quiçá repreendido pelos companheiros mais calejados nestas andanças, tratou de colaborar no segundo dos minhotos. Salvou-se a honra do convento: a absolvição total que o lance dos 4´ prometia só ficaria devidamente garantida num cenário de derrota; um empate poderia pôr tudo em risco; uma vitória - "nem me falem nisso" - deitaria tudo por terra.

Foi portanto com grande afoiteza e sem assombros que todos os responsáveis técnicos e futebolistas do clube da casa deixaram acusações de roubo e injustiça. Noite de sábado mais descansada era difícil.
Duas notas mais a propósito do – houve quem lhe chamasse assim – "jogo de futebol" de sábado: por mais limitado que seja o orçamento leonino para esta época, é uma perfeita indecência que o Sporting recorra a gorilas (que desconheçam a lei do fora-do-jogo; os outros, tudo bem) para colmatar evidentes deficiências na frente de ataque, mesmo que derivadas da saída de um ninja (que todos sabemos que é do caraças encontrar um de confiança cá por estes lados). É uma atitude a todos os níveis condenável e que, cuido eu, deveria ter a devida reacção por parte das organizações ambientalistas e sindicatos dos profissionais da bola.
Além disso, permitir que o melhor dianteiro do clube, desde sempre brasileiro, se transforme, por artes administrativas - as piores -, num avançado português (mole, previsível e ineficaz) é lamentável.
Não é com transformismos e exploração animal que vamos lá, pá.

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