Dos ordenados

Tendencialmente, dir-se-à que os ordenados são baixos. Dir-se-à que a recompensa monetária concretizada no salário mensal médio não é a adequada ao dispêndio de energia vital (de vida) que o trabalho médio exige (1). Pois estou cada vez mais convencido de que isto não corresponde à realidade. Afinal de contas, e aceitando estes termos, o desperdício diário da nossa vida não tem (não pode ter) preço. Dizer-se que os ordenados são baixos constitui-se, assim, como uma meia-verdade (2). Posto isto, fará sentido ponderar numa outra maneira de colocar as coisas, em alternativa à proposição «os ordenados são baixos». Tal como, por exemplo: os horários de trabalho são grandes. Demasiadamente grandes.
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Dir-se-à que, mais que desajustados relativamente ao dispêndio de energia que implicam, os ordenados são, isso sim, insuficientes para permitir uma «qualidade de vida» satisfatória. Quanto a isto, e sem simplificar em excesso ou moralizar, fará sentido alertar para a proporção normalmente observada entre o ordenado auferido e as dívidas acumuladas, em que estas, das duas, uma, ou equivalem, ou superam aquelas, lógica muito própria das sociedades capitalizadas, como a portuguesa.
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(1) E com isto refiro-me à quantidade de horas que o emprego suga, seja em funções, seja nas deslocações, e à qualidade das horas que dele sobram, ou melhor, da falta dela.
(2) Que até pode servir de pretexto ao alargamento de horários ou a outras investidas patronais.

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