Carta ao senhor Palma

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Bom dia, bom dia, bom.
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Espero em primeiro lugar que se não aborreça com a minha falta de etiqueta redactorial e ortográfica, a qual, senhor Palma, pelo pouco que até aqui houve para ver, já todos entendemos que fica largamente aquém das balofas vénias e Excelentíssimos e Ilustríssimos e demais íssimos que, bem sei, bem sei, são requisito mínimo nos dias que correm; mas quer-me parecer que nem eu estaria à altura de tamanha fineza, nem o senhor se sentiria mais obsequiado por eu me pôr em biquinhos de pés.
Acabo de ouvir um álbum com músicas suas. Muito o tenho escutado ultimamente, aliás. Vai talvez para um ano que dei por mim frente a um escaparate de uma grande superfície a dizer
Não conheço Jorge Palma,
veja bem o meu amigo as coisas que por preguiça mental e por força do hábito insistimos em proferir, quem na altura me ouvisse diria numa lógica 1,2,3 que agora já o conheço, o que sabemos ser uma completa tolice, mas importará acrescentar que esse hipotético interlocutor seria dessas comuns pessoas que crêem realmente que, não só conhecem os outros, como se conhecem a si próprios, e isso deveria ser quanto baste para nos deixar de atalaia quanto a novos hipotéticos canais auditivos de terceiros, ou melhor dizendo com as palavras que nos enchem a boca e nos despistam dia após dia (se não as palavras propriamente ditas, as ideias a que dão corpo, ou ambas de conluio, uma diz Mata, outra Esfola), e isto é quase dizer que, e era aqui que eu queria chegar, temos de tomar atenção connosco mesmos, nós que, sim, somos terceiros de terceiros, mas sobretudo nas muitas ocasiões em que nos ouvimos como acaso falasse outra pessoa cá dentro da caixa dos pirolitos, como parece ter sido o caso,
mas contava-lhe que estava eu frente a um escaparate brilhante e comprido de uma dessas superfícies grandes a dizer
Não conheço Jorge Palma
e isto calhou boamente no nascer do mês, ainda o ordenado cheirava a novo, ainda o ordenado estava praticamente intocado, para mais o preço (confesso) convidava, paguei quase nada pelas duas caixitas de plástico, uma pechincha às antigas, não sabia que havia disto nestes mirdia marquete ou lá que é isto, ficou-me nos oito euros, mais coisa menos coisa.
Mas eis-nos finalmente (finalmente) chegados à foz deste benquerente arroio que algo sinuosamente fiz desaguar no seu por assim dizer oceano particular, criado e mantido a seu custo e mérito, apenas para lhe dizer: gosto muito da sua música, senhor Palma.
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Agora eu tenho que ir andando.

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