Chinfrins

As autoridades (as oficiais e as do mercado) muita vez as ouço em cuidados com o pouco que as gentes lêem, na medida em que isso está a montante de toda a sorte de falências formais das linguagens falada e escrita, tomem elas corpo no lamentável erro grafado ou na ordinária patacoada oralizada.
Segundo o costume e o contrato com a editora, tais arrelios são tornados públicos em sessões de apresentação de prontuários ortográficos da língua camoniana - essa cabra traiçoeira -, eventos intelectuais como o caraças onde se trata de limpar o sebo a dois coelhos de uma só cajadada: não só essa gentalha ignara lê - aqueles volumes, bem entendido - como passa de imediato ao contacto com os erros que, assim, nunca chegará a cometer. Novamente.
Atalha-se caminho e aligeira-se a civilização do povinho. Um brinco.
Às duas por três, porém, a preocupação idónea das autoridades (das duas) enfim se desmascara em indignados trejeitozinhos de nojo e reprovação - os narizes afectados e as beiças repuxadas - que mais se assemelham à jactância da etiqueta social perante um talher fora do sítio ou à prosápia da moda diante de uma peça démodé. Um chinfrim.
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-+asdh,
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Muito me pasmo porém com o imperturbável desinteresse que essas mesmas autoridades dedicam à agonia da Conversa - a livre, a louca, a higiénica Conversa. Cuido até que a sua conservação mereceria um par de despachos ministeriais e um punhado dessas fabulosas tabuletas de madeira amiúde plantadas à borda dalguma estrada de alcatrão, "Natureza a 150 metros, à direita", mas com este dito gravado em caracteres antigos (para cativar o estrangeiro): "Reserva Nacional de Conversa" - à porta de um tasco onde cavalheiros conversavam, sem pressa e com espírito, a prosa solta e largamente regada a café, com a leveza de dançarinos, multiplicando infinitamente as suas inteligências.

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